Saturday, September 20, 2008

Um conto... Aumentado.

Indigente


Vou correr contra o tempo. Não consigo sorrir para esse sofá monótono e inútil. Quero ganhar o asfalto; mal sei atravessar as ruas.
- Mãe, quanto trânsito e poluição! A gente vive trabalhando! Ah, eu queria viver no campo com as vaquinhas!
O espelho retrovisor tenta me comover.
"Por que é que eu preciso ter pena de mim? "
Não sei se combino com o urbanismo. Às vezes tenho vontade de não comer nada, ficar pálida e com olheiras monstruosas: gosto de parecer inacessível. É uma força que faço para que não me incomodem.
"Hã? Hum? Falou comigo?"
"Menina desligada!"
"É, ahn!"
Volto ao momento em que me vi tão desprendida. A calça nova já velha, preta e desbotada, um andar solto, os tênis frouxos. Carrego poucas moedas. É tudo o que tenho.
"Um ladrão passaria reto por mim."
Não tenho nada. Só uma sprite, que pareceu combinar com meu espírito (a propaganda não é cruel). E tenho uma boa alma, ah! Mas isso ninguém rouba. Um ladrão passaria reto por mim. Talvez até zombasse, ora essa! Eu só tinha minhas moedas!
Vi-me assim. Soltei as moedas: dormiram no chão. Sorri para a vida.
"Ah, meu Deus! Essa vida é boa. Eu não entendo nada, não sei de nada, sei só enrolar o tempo. Sei também fingir que sou feliz."
Não havia nada que eu desejasse. Desejar implica desgaste. Eu sabia até aceitar que um dia poderia não mais ter o amor que me move, tanto amor já me moveu... morreu. Eu sei rir. Sou feliz com minhas moedas. Sei gozar com devaneios. E não preciso de um outro ser. Sei viver como um vagabundo na calçada. Gosto de chorar mágoas vendo o Sol nascer. A vida é bonita, para quem sabe se enganar. O homem dos papéis, todo sujo, todo riso... Riso que corta, riso que me cortou. Riso que me diz:
- A vida é boa, menina!
Riso que conforta-se. E conserva vida.
"A vida é boa!"
Meu sorriso é todo lágrimas. A vida é injusta com esse homem.
Nunca vou me esquecer daquele riso.

8 comments:

Beth Carolina said...

Lindo!

Tem presente pra vc lá no Quase!

Tyler Durden said...

Vc deu uma bela sumida hein! Achei que tivesse desistido do blog tb.

Muito bom o seu texto, pricipalmente essa frase: " A vida é bonita, para quem sabe se enganar." Faz todo o sentido do mundo.

Não suma tanto assim, gosto de ler seus textos, são de muita sensibilidade.

E agradeço pelos elogios, pra quem não vive um bom momento essas simples palavras fazem muita diferença. Juro que essa foi a melhor coisa que me aconteceu hoje.

Um grande beijo.

ChulapA said...

olaaa
gostei do conto, e do blog tb..bem bacana...bjs
www.chulapa.com.br

RITINHA said...

Que orgulho desse texto, tão lindo!
Te amo muito...

Unknown said...

Oi Rafa,

Só agora pude ver o comentario que vc deixou no meu blog. To altamente sem tempo esses dias. Quase não paro em casa, motivo esse de não atualizar meu querido "depósito de amenidades'. =)
Obrigada pela visita, pelos elogios e pelas tão bem colocadas palavras.
Beijos mil pra vc!
=*************

Candy said...

Tem cenas que jamais esquecemos.
As boas e as ruins também.

Gostei do texto
:D

Quanto a morar no campo, como vc comentou no meu blog, pra mim não da certo.Não mesmo.
heheheh

bom domingo
;***

Sujeito Oculto said...

Não tenho pena. Sou privado desse sentimento.

Thiago da Hora said...

O nome do seu blog me fez pensar. Seria uma coisa do tipo você está privada de possuir sentimentos, ou reprime o que sente por motivos pessoais, ou usa o blog como uma forma de "despejar" seus sentimentos, seus pensamentos pelo mundo?